quarta-feira, 6 de setembro de 2017

Nova Carta aberta ao Presidente da República V

Crime incendiário = crime político = demissão do governo?!
Carta aberta ao Presidente da República
Exmo. Senhor Presidente da República,
Prof. Doutor Marcelo Rebelo de Sousa,
É agora que V. Excelência vai demitir o governo e dissolver a Assembleia da República? Já apresentei muitas razões para isso e o tempo tem-me dado toda a razão. Desta vez o argumento é fortíssimo. Há décadas que muito se tem escrito e falado sobre as causas dos incêndios em Portugal, recentemente formulei muitas questões, dúvidas e interrogações, em cartas anteriores e a minha convicção é de que os incêndios são, maioritariamente, de origem humana e intencional, portanto, criminosa.
Parece-me que há quem queira branquear estes graves crimes lançando a ideia, como verdade oficial, de que a maioria dos incêndios tem origem negligente e involuntária e, como tal, isentos de responsabilidade, ficando impunes. Esse tem sido o discurso da maior parte dos políticos no poder nas últimas décadas. Apelo, por isso, ao senhor presidente da República para que tome uma atitude firme contra a falsidade que nos querem impor, atirando poeira ou fumo para os olhos. Em algumas notícias recentes transpareceu essa ideia, reforçada pela intervenção de alguns psicólogos, de que os incêndios tiveram, maioritariamente, uma origem humana, mas negligente muitas vezes associada a um quadro de deficiência mental e alcoolismo. Não podemos aceitar esta trapaça, isto é, que no nosso país haja tanta negligência, uma negligência sistemática, repetida a cada minuto que passa, de noite e de dia, na Beira Baixa, em Trás-os-Montes, na Beira Alta, no Minho, no Alentejo, etc. Parece-me que a negligência tem as costas excessivamente largas. Não podemos aceitar que todos os anos, no Verão, o país se transforme num mega manicómio que lança fogo às florestas.
Alguns políticos da oposição falam em má coordenação da Protecção Civil, outros, nas falhas do SIRESP, no abandono do Interior, na ausência de sapadores florestais, nos interesses económicos, no desordenamento florestal, na meteorologia, etc., talvez seja tudo isso, mas parece-me que ninguém está interessado em procurar a verdade, em pôr o dedo na ferida, isto é, em procurar e revelar quais as verdadeiras causas e motivações do crime incendiário sistemático. A quem interessará ocultar a verdade para que tudo fique na mesma e todos os anos se repita a mesma calamidade incendiária? Porque é que o primeiro ministro receou perder popularidade e encomendou uma sondagem? Porque é que algumas notícias em Espanha previram a queda do governo?
Depois da tragédia de Pedrógão Grande os órgãos de informação deram grande destaque a um facto importante que, alegadamente poderia estar associado a graves falhas da Protecção Civil e que, por isso, poderia explicar tão grande número de vítimas mortais. Esse facto foi a substituição, pelo governo de grande parte das chefias da protecçao civil pouco antes do Verão. Depreendo que os comandantes nomeados não tinham competência ou preparação para desempenhar as novas funções. De facto, os incêndios multiplicaram-se em Junho, tal como em Julho e Agosto de uma forma nunca vista em quantidade e violência de tal modo que muitas povoações ficaram rodeadas pelo fogo, muitas casas arderam apesar dos fortes dispositivos de combate no terreno e alguns concelhos ficaram com a quase totalidade da sua mancha verde reduzida a cinza. Mas, como se explica que a incompetência ou falta de preparação dos novos comandantes tenha dado origem a mais incêndios e a incêndios mais ameaçadores? Como se explica que, alegadamente, uma maior incompetência da Protecção Civil tenha resultado em mais negligência das populações a fazer churrascos ou a usar máquinas? Ou será que, alegadamente, os comandantes destituídos, ou alguém por eles, tenha cometido algum acto de vingança como retaliação à sua destituição?
Não me parece que a grande onda de incêndios deste Verão, evidenciada em pavorosas reportagens televisivas, se possa enquadrar em puros actos de negligência, em que muitos incêndios começaram de madrugada, alguns autarcas suspeitaram de mão criminosa mesmo que tivessem começado de dia, muitos reacendimentos também pareceram muito estranhos e a maioria apresentava várias frentes de grandes proporções logo de início. Estou convencido de que as altas temperaturas, a seca e a negligência não justificam esta enorme vaga de incêndios, às dezenas ou centenas, diariamente. Perante esta análise, é legítimo que tenha que haver mais alguma causa ou explicação para tudo isto: terá havido vingança política, do género: “vê lá se sabes coordenar o combate ao fogo melhor do que eu?” – enquanto os incêndios deflagravam acima, abaixo, ao lado, mais além, no vale , na montanha, junto da povoação e sempre de forma violenta e ameaçadora. Estaremos, por isso, perante um crime político que o poder político sempre quis ocultar com a ajuda dos outros poderes do Estado e de toda a comunicação social subserviente e ainda com a desculpa de que o poder político não interfere no poder Judicial? Esta hipótese não pode ficar na gaveta como tem acontecido todos os anos com a investigação ao crime incendiário porque, apesar de terem sido detidos dezenas de alegados incendiários não me lembro de terem sido tornadas públicas as sentenças e as medidas para evitar reincidências. Esperemos, desta vez, que a promessa de que tudo será investigado até às últimas consequências, seja cumprida.
Aliás, estando eu já a alinhar o rascunho desta carta surge a notícia de que noventa e sete por cento dos crimes incendiários são arquivados e os restantes três por cento levam penas leves e/ou suspensas. Relacionando tudo isto, parece-me que as peças do puzzle começam agora a encaixar umas nas outras, senhor presidente.
Todos os crimes de incêndio são negligência; Nenhuma negligência é investigada por que não é intencional; Logo nenhuma investigação incide sobre os crimes de incêndio. Tudo é negligência, nada é crime e por isso não é preciso investigar nem castigar. Não é por isso que a Judiciária se apressa a confirmar a negligência ou causa natural para que o primeiro-ministro vá de férias descansado enquanto mais tarde, marca presença em Barcelona para homenagear as vítimas do terrorismo porque ali, houve mesmo crime? Não é por isso que nenhum incendiário é preso e castigado? Não é por isso que os incendiários agem sempre por motivos fúteis, são libertados e o processo arquivado? Não tem sido sempre assim desde há décadas, em que o país arde e ninguém é responsável porque a liberdade política é sinónimo de impunidade e os fins justificam sempre os meios? Basta um pequeno relance:
Não é verdade que em nome da liberdade política, se pode matar, assaltar bancos, cometer atentados bombistas, levar o país à bancarrota e os bancos à falência, destruir escutas telefónicas validadas por um juiz de Aveiro sobre o crime de alegado atentado ao Estado de Direito, condenar e castigar elementos das forças de segurança e libertar os criminosos, manter o Poder Judicial (sem recursos materiais e humanos) refém do poder político, etc.?
Não é nesta lógica de ocultar a verdade, senhor Presidente, que o primeiro ministro tenha feito recentemente um apelo a toda a classe política e principalmente à oposição para que não fosse quebrado o consenso nacional sobre o aproveitamento político da tragédia dos incêndios que V. Excelência também subscreveu? Que significa esta atitude? Porquê este pacto de silêncio de toda a classe política, de comentadores políticos, dos partidos, dos deputados, etc. para que nada se saiba? Porque é que nem o PAN abriu o bico para se revoltar contra esta tragédia humana e ambiental provocada pelos incêndios em que a natureza ficou reduzida a cinza e muitos animais morreram ou ficaram feridos e sem habitat para poderem sobreviver? Será que têm todos telhados de vidro? Porquê este tabu em exigir responsabilidades políticas por uma tragédia? Não é obrigação do Estado garantir a segurança das pessoas e bens?
Por que é que no regime actual é impossível exigir responsabilidades políticas enquanto no anterior os chefes do governo e titulares de órgãos de soberania foram culpabilizados, saneados e desterrados devido às funções políticas que exerciam? Agora que temos uma ditadura de três partidos (três partidos que perderam as eleições) não deveríamos exigir muito mais responsabilidades políticas? Porque é que um médico é condenado quando deixa morrer um doente e o governo fica impune quando deixa morrer dezenas de cidadãos e o país em cinza? Não devia pedir a demissão ou ser demitido imediatamente?
Senhor, presidente da República, não podemos fugir aos problemas e dizer que tudo vai bem. Se já foram presos mais de uma centena de incendiários com um perfil psicológico, na generalidade, de deficiência mental e alcoolismo é preciso fazer uma análise psicanalítica muito mais profunda porque o que nos é mostrado não chega a ser a ponta do iceberg e as verdadeiras motivações ficam ocultas não por serem inconscientes mas porque a ideologia do regime se nega a revelá-las para não assumir a responsabilidade. O senhor Presidente da República não pode ficar à espera que uma sentença transite em julgado, num sistema judicial paralisado, sem meios e refém do poder político, para demitir o governo. A Justiça julga factos e crimes mas os crimes políticos requerem uma outra avaliação de âmbito mais elevado com base numa intuição política superior, isenta e objectiva que permita ao mais alto magistrado da Nação tomar uma decisão justa, imparcial e independente.
Não podemos pactuar com mais impunidade. Todos os cidadãos são iguais perante a lei. As vítimas mortais e as pessoas que ficaram sem casa e sem os seus bens clamam por justiça. São milhares de hectares em cinza, são inúmeras casas destruídas, são vidas arruinadas que ninguém pode reparar e colocar como estavam antes.
O que valem as visitas aos locais da tragédia para distribuir beijinhos e abraços e dar palmadinhas nas costas às pessoas que ficaram na penúria se o poder político tem uma noção clara de que os incêndios são crimes políticos que resultam de guerras partidárias muito mais graves do que as guerrilhas sindicais da AutoEuropa que muito revoltam alguns membros do governo? Estas alegadas visitas solidárias do governo e do presidente da República não são, afinal, um puro acto de hipocrisia e uma grande palhaçada? Não é uma grande palhaçada continuar a esconder a verdade e não permitir que se faça o aproveitamento político das tragédias com o objectivo de ganhar eleições? Porque é que Pedrógão não pode entrar na campanha eleitoral? É porque ralham as comadres e descobrem-se as verdades? Pedrógão Grande não faz parte do território nacional? O que vale uma campanha eleitoral baseada na mentira em que muitos candidatos já estão manchados pela corrupção? A quem interessa camuflar a realidade? O que valem as promessas eleitorais se os órgãos do poder do Estado não agem segundo a justiça e o crime vale mais do que a honestidade?
Todos estes males começam na Constituição, já o referi algumas vezes. É preciso uma nova Constituição. A actual pactua com o crime, com a mentira e com a injustiça. Basta um pequeno exemplo, o artigo 187.º que afirma que o primeiro ministro é nomeado tendo em conta os resultados eleitorais”. Então não havia de ter? Para que servem as eleições? Porque é que a Constituição permite que a soma de três derrotas vale mais do que uma vitória?
Senhor presidente da República, a calamidade incendiária é um crime demasiado grave para que o governo continue em funções. É imperioso dissolver a Assembleia da República, formar um governo de salvação nacional e convocar novas eleições para que se possa redigir uma Constituição que defenda o povo. É preciso enfrentar a verdade. As querelas sobre o destino dos donativos às vítimas é um problema grave mas é também uma forma de desviar as atenções do verdadeiro problema: é ou não é verdade que o crime incendiário é crime político?
Senhor Presidente da República, espero uma resposta urgente a esta questão em nome de todos os portugueses, da justiça, da honra e da dignidade do povo.
Apresento a V. Excelência os meus cumprimentos.

António Oliveira

Sem comentários:

Enviar um comentário